segunda-feira, 14 de maio de 2012

CASA DA XICLET – a casa como obra de arte

Por Elaine Gomes

Foto: Luis Carlos Vieira



Eu também sou artista e estou exposta aqui”, diz Adriana Xiclet, fundadora da CASA DA XICLET, localizada no famoso Bairro da Vila Madalena, em São Paulo. Xiclet é daquelas pessoas que encontram possibilidades e criam oportunidades.  “Uma vez tinha um boldo [a planta] bem ali entre os blocos da parede, e o boldo foi achando um jeito, crescendo em direção ao sol. Eu fico procurando os caminhos que eu vou criar, como o boldo”, resume.

Muitos desconhecem, mas a Vila Madalena divide-se em “Madalena” do alto e “Madalena” de baixo.  Hoje, a parte valorizada é a  Vila do alto, a dos bares, das galerias de arte, dos belos restaurantes e da vida noturna. Mas a casa da Xiclet, alugada há oito anos, fica na Madalena de baixo, e  vai interagindo com a privacidade da Xiclet e com o público.

Capixaba, Adriana Xiclet é artista plástica formada pela Universidade Federal – UFES. Quando chegou à capital paulista, em 1999, começou a sua peregrinação pelas galerias e espaços de arte.

Para a surpresa de Xiclet, aqui em São Paulo, já havia se realizado uma exposição com o mesmo tema do seu trabalho, responsável pelo apelido Xiclet. A instalação artística tinha como conceito o reaproveitamento do chiclete. Assim Adriana começou a ser reconhecida e chamada de  Xiclet em sua cidade Linhares e nos circuitos artísticos.

Como o boldo, Xiclet continuou procurando os seus caminhos, e em 2004, já com experiências em trabalhos educativos, em museus e grandes exposições em São Paulo, além do mestrado concluído, Xiclet decidiu parar de procurar, de oferecer os seus trabalhos em galerias. Iniciando um processo de investigação - entre os educadores artistas que havia conhecido, com quem havia estabelecido parcerias, pensou: “por que não expor o trabalho desses artistas, que como Xiclet, não conseguiam o espaço expositivo?”

“Eu fui colocando os meus amigos, eu mantinha a casa com o meu trabalho, pagava o aluguel e não precisava cobrar nada de ninguém. Eu tinha o meu trabalho fora da casa, também expunha na casa e mantinha a visitação pública com hora marcada”.

Nos primeiros tempos os vizinhos, Rua Fradique Coutinho, 1855, segundo Xiclet, não entendiam muito bem o que estava acontecendo. “Aqui na Vila as pessoas convivem com  culturas e hábitos diferentes dentro do mesmo bairro. Mas o lugar lembra muito o lugar onde eu morava no Espírito Santo, e por essa razão estou aqui há tanto tempo”, conta Xiclet.

Patrimônio Difuso A possibilidade de um espaço privado tornar-se público envolve muitas questões: “Se a ideia é tornar a Casa da Xiclet num espaço cultural público, visando sua preservação, é preciso que haja o envolvimento do Ministério Público. Em se tratando de uma propriedade privada, é preciso que haja um reconhecimento oficial de que há ali um "patrimônio público difuso". O termo difuso é justamente o aplicado a casos assim.  Não é uma tarefa muito simples, principalmente em se tratando de um espaço cultural criado num tempo relativamente recente para os padrões arquitetônicos exigidos. Se houver, por exemplo, um grafite dos Gêmeos ou alguma obra ali registrada de algum artista que tenha mesmo uma notabilidade maior, as chances de obter alguma proteção aumentam”, afirma a advogada Alexandra Pericão.

Muitos artistas começaram a expor suas obras na Casa da Xiclet, onde tudo é feito manualmente, como ela mesma diz: é caseiro. Os impressos, os folders, a divulgação das exposições são confeccionados com tesoura, papel e cola. O que reafirma o conceito de casa, uma casa compartilhada.  “As pessoas precisam estar em casa, esse é o conceito. Se não entenderem isso, não vão entender a casa”, diz ela.

“Lembro-me, apenas, a título argumentativo, que se tratar de um imóvel privado, pensando talvez que um tombamento - não sei se é o caso - implica consequências para o proprietário, pois se trata de uma restrição imposta sobre o bem. O dono não poderá, sequer, reformá-lo sem autorização pública” diz o advogado Luiz Augusto Carvalho.

Xiclet não pensa em tombamento. “Eu quero ter uma casa, se for tombada eu vou sair da minha e o proprietário também não vai querer. Tudo o que ele exige é o aluguel em dia. Agora, se eu morrer e os meninos quiserem transformar em fundação, é outra história”.

Pajé é um artista expoente e frequentador da Casa, em muitas palestras é ele que representa a Casa da Xiclet.Para ele, a provocação que a Casa permite é justamente essa: é a Casa da Xiclet, não pode tudo.  Ele conta que só quando as pessoas começam a frequentar a Casa é que passam a entender a proposta. Além de ser um lugar público, é a Casa da Xiclet.

Já Carlos Alcobia conheceu a Casa da Xiclet por meio da apresentação de um livro que falava de coletivos independentes, realizada no ateliê 397, no mesmo bairro. Acompanhando a Bienal de Artes em 2010, com colegas do mestrado da Universidade de Lisboa, Alcobia pesquisava assuntos curatoriais e coletivos. Nessa apresentação pode conhecer alguns artistas da Casa da Xiclet, entre eles André Sztutman e  Rafael Piovani, o Pajé, já citado.
“Antes de retornar a Lisboa fiz uma visita à Adriana e conheci o espaço, a dona, a história e o conceito e penso que neste caso tudo se mistura.

Identidade, privacidade, memória, conceito e discurso pessoal e público misturam-se num só, quando falamos da Casa da Xiclet e da Xiclet (Adriana)”, acredita Alcobia.
A Casa da Xiclet proporciona um espaço de encontro. Citando a frase do artista Helio Oiticica, um lugar que eu quero conversar. Assim, Xiclet vai definindo o seu espaço, que também é do público.

“É por ser um ponto de reuniões de histórias que hoje a Casa da Xiclet constitui uma história própria. E dessa historia é inaliável a figura da Adriana. Afinal, na casa só se reúne gente se alguém juntar as pessoas, e essa missão cabe à dona da casa”, diz Alcobia.

A Casa da Xiclet promove exposições temporárias, mas também possui o seu acervo. Em comemoração aos seus sete de anos de existência em 2011, foi publicado o Jornal Retaguarda, com 19 páginas, ilustrado e com ficha de inscrição para expor na galeria.
“A Casa sou eu, a galeria são os artistas” diz Xiclet.

Atendendo principalmente os artistas contemporâneos, estimulando discussões, provocações estéticas, o que Xiclet chama de verticais, as linguagens se complementam e os frequentadores-artistas vão encontrando caminhos, feito o boldo.

A Casa não é só exposição e galeria, mas é também o que ela denomina autoescola [a pessoa decide o tempo e a maneira do seu aprendizado] um espaço para reflexão, diálogos, oficinas para artistas e pesquisadores. Para pessoas de todas as idades e interesses. A autoescola  tem livros,  material para trabalho e o espaço para a conversa ou mesmo para o silêncio. A Casa sempre estará aberta para aquele que participa, não só quando quer expor, o que é  uma regra da Casa. Afinal, a Casa é da Xiclet.

Sua programação é intensa e nos meses de maio e junho/2012 acontece:

FEIRA ORGÂNICA
Exposição: De 06 de maio a 03 de junho de 2012Abertura: sabado, 05 de maio, às 20HA mostra Feira Orgânica SP-Arte, reunirá obras dos artistas Antonio Maués, Camilla Nascimento, Maria Jo Steck, Ricardo Ramalho, Náná Spogis, Diego Argentina, André Albuquerque, Jeesse Ferreira Farias Junior, Sofia Schattan, Matchaca, Rogério Camargo e grupo Pele Coletiva de Criação.
Perfomances: No dia 05/04/12, às 21h, o grupo Pele Coletiva de Criação composto por Maike Rinne, Gustavo Vellutini, Vitória Cohn, Natasha Belfort, Thomaz Kardos e Victoria Vic, Luca Motta Leal, Victor Bauab apresentará a performance /dança intitulada “Pele” (duração 20 minutos); e às 22h, o artista Ricardo Ramalho fará a performance do Palhaço Leigo, do tipo stand up, com dicas para os jovens artistas, (duração 10 minutos).


Auto-escola: Oficina de Criação Literária com Matheus Carrera Massabki, todas quintas de maio e junho , a partir das 16h, sem hora pra acabar.

Inscrições pelo e-mail: casadaxiclet@gmail.com , (R$ 10,00 por quinta)
Inscrições pelo e-mail: casadaxiclet@gmail.com , (R$ 10,00 por quinta)
Inscrições pelo e-mail: casadaxiclet@gmail.com , (R$ 10,00 por quinta)
A Casa da Xiclet está localizada na Rua Fradique Coutinho, 1855, Vila Madalena – SP.


Para Visitar:
De quinta a domingo: de 14h ás 20hSegunda, terça, quarta e feriados: recesso espiritualhttp://casadaxiclet.com/



Verticais Reflexivas:

 “A casa tem que estar sempre limpinha, se não fico nervosa, a curadoria que eu faço é cuidar”.

“Agora, ás 20h, fecha tudo e na manhã seguinte, tudo limpinho, por isso que eu gosto do vertical e não do paralelo”.

“Um lugar onde as pessoas vão para conviver, conversar e não só para expor”.

“Já teve gente que entrou aqui só para usar o banheiro, nem a minha privada é privada”.

“Eu trabalho com artistas carentes, tem gente que é boa prá caramba e arte não é elite”.

“A senhorinha do interior tem um quadro na parede, sabe arrumar muito bem uma toalha na mesa,  é estética”.

“Mercado de arte não faz sentido, a arte transforma”.

“Eu tenho uma galeria dentro de uma casa”.




 

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